sexta-feira, 7 de maio de 2010

A estória do gato e da lua

No princípio era um negro absoluto. A imensidão calma da noite. Depois ela surgiu e tudo mudou. Há muito que deixei de procurar. Agora tudo é mais calmo. Aprendi que é melhor esperar, ela virá quando puder ou quando quiser. Sei que um dia virá ter comigo. Senão vou passar horas a fio, noite inteiras a observar-lhe. Nada mais importa. Eu espero.

Mas nem sempre foi assim. Depois de a conhecer minha vida mudou. Procurei segui-la. Por ela atravessei mares, corri oceanos. Cheguei mesmo a andar a deriva. Tanto fiz pra a encontrar. Quando julguei estar perto, estava ainda bem longe. Me senti perdido sem saber o que fazer. No meio de tanto mar. O barco tornava-se cada vez mais apertado, o mundo cada vez mais pequeno pra toda aquela paixão.

Foi então que mudei de vida. Arranjei casa, e confortavelmente instalado, julguei irrecusável a minha proposta. Mas de novo ela fugiu. Desesperado então fui de telhado em telhado atrás dela, escravo daquele desejo, prisioneiro daquela atração que pouco a pouco me deixava cada vez mais só.

E o tempo passou. Agora já não corro. Espero apenas. O resto não importa.
Realização: Pedro Serrazina

E eis que numa noite dessas de surpreender aos mais acostumados, ela aparece e o toca. Ele se espanta em ver sua beleza tão de perto. Mal a reconhece e não pensa duas vezes em tocá-la, e a acaricia, e se sente feliz com aquela possibilidade. Tão feliz, tão feliz, que ele começa a subir pelo seu corpo e já quase não se distingue quem é quem. E os dois se envolvem e ela o leva, e nesse carinho, os dois se tornam um só, resplandecente.

Oh, gato, volta pra mim. Volta pra tua casa. Eu sei que a lua é bonita, mas é triste demais não ver-te quando chego em casa. Vida minha, amorzinho meu, volta pra mim. Não demora, não. Diz pra essa lua que a tua mãe o espera e que é preciso ir. Toma cuidado, meu gato preto. Longe de mim querer possuir-te, mas apenas desfrutar da tua presença como sempre fazíamos. Vem me tagalerar, vem me acordar, vem porque essa casa precisa de você.

Porque o choro dói mais quando se está sozinho.
Porque os gatos sabem quando um amor é pra sempre.

Um comentário:

Fabio disse...

Que maravilha. Foste na jugular. e identifiquei-me deveras também...